quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Escravidão sem fim


Autor(es): agência o globo:Geralda Doca
O Globo - 26/10/2011

OIT diz que Bolsa Família e fiscalização não conseguiram vencer o
trabalho degradante
Oprincipal programa de transferência de renda do governo, o Bolsa
Família, e a fiscalização não têm sido suficientes para extirpar o
trabalho escravo no Brasil. Estudo divulgado ontem pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT) traçou, pela primeira vez, o perfil
das vítimas do trabalho escravo no país. Elaborado a partir do
depoimento de 121 trabalhadores resgatados entre 2006 e 2007, o estudo
mostrou a baixa escolaridade dos resgatados e a falta de ações para
criar oportunidades nas regiões que mais fornecem este tipo de mão de
obra.
Em 67% das famílias de trabalhadores libertados, existiam crianças e
adolescentes, sendo que 28% (quase um terço) delas eram beneficiárias
do Bolsa Família. O levantamento revelou também que quase 60% dos
trabalhadores resgatados no país já foram escravizados antes e que a
fiscalização do governo conseguiu libertar apenas 12,6% do universo de
trabalhadores nestas condições, de acordo os dados do Ministério do
Trabalho.
A pesquisa apontou forte relação entre trabalho escravo e infantil no
país: 92,6% do total de entrevistados começaram a trabalhar antes dos
16 anos. Na média, aos 11,4 anos, mas cerca de 40% já trabalhavam
antes.
Segundo Luiz Antonio Machado, coordenador do projeto da OIT de combate
ao trabalho escravo no Brasil, o Bolsa Família ajuda a reduzir a
vulnerabilidade dos trabalhadores porque melhora a alimentação das
famílias. Mas, por si só, não evita que os chefes dessas famílias se
submetam a condições degradantes de trabalho, com cerceamento de
liberdade - o que caracteriza o trabalho escravo.
- O Bolsa Família é insuficiente e a fiscalização não consegue cobrir
todo o país ou mesmo os estados com maior concentração (da
irregularidade) - afirmou Machado.

Agropecuária concentra trabalho escravo
Machado destacou que o alto índice de recorrência - 59,7% dos
resgatados já haviam estado na situação de escravidão anteriormente -
deve-se à falta de alternativas, restando aos trabalhadores sem
qualificação nas áreas rurais apenas a "empreitada", que exige só
força física. Segundo ele, também é preciso investir em campanhas de
conscientização frequentes para estimular os próprios trabalhadores a
fazerem a denúncia. Na maioria das vezes, eles são liberados no fim da
empreitada sem receber pelo serviço.
A renda média declarada desses trabalhadores foi de 1,3 salário
mínimo, sendo que 40% informaram ser o único responsável pela renda
das famílias que têm, em média, 2,4 filhos.
Ele defende a necessidade de ações complementares para tornar as
politicas mais efetivas. Entre elas, estimular a criação de empregos
nos locais de residência dos trabalhadores e oferecer cursos de
capacitação profissional.
De acordo com a pesquisa, 85% dos trabalhadores entrevistados, além de
terem baixíssima escolaridade (analfabetos e com menos de quatro anos
de estudo), nunca fizeram curso de qualificação. No entanto, 81,2%
declararam que gostariam de fazer algum curso, principalmente os mais
jovens (95,2% dos que têm menos de 30 anos). A preferência recai nas
áreas de mecânica de automóveis, operação de máquinas, construção
civil (pedreiro, encanador, pintor) e computação.
Maranhão, Paraíba e Piauí são os exportadores de mão de obra escrava
para outros estados. Eles estão entre as principais origens dos
trabalhadores resgatados em Goiás (88%) e no Pará (47%). No Mato
Grosso e na Bahia, 95% deles eram da própria região.
Segundo a OIT, a agropecuária continua sendo o setor de maior
concentração de trabalho escravo, sobretudo nas fazendas de
cana-de-açúcar e produção de álcool, como é o caso do Pará; plantações
de arroz (Mato Grosso); culturas de café, algodão e soja (Bahia); e
lavoura de tomate e cana (Tocantins e Maranhão).
Segundo a pesquisa, o aliciamento se dá, na maioria dos casos, pela
rede de relações pessoais; os "gatos" (aliciadores) e escritórios que
funcionam como agências de emprego aparecem em segundo lugar. Em
terceiro estão hotéis, pensões e locais públicos, como rodoviárias,
estações de trem e ruas das cidades.
O conceito de trabalho escravo apontado pela OIT considera, além das
condições precárias (falta de alojamento, água potável e sanitários,
por exemplo), cerceamento à liberdade pela presença de homens armados,
dificuldades de acesso às fazendas e dívidas contraídas de forma
forçada pelos trabalhadores para pagar alimentação e despesas com
ferramentas usadas no serviço.
O Ministério do Trabalho informou que a pasta não comentaria a
pesquisa porque o responsável pela área de fiscalização estava
incomunicável ontem.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

CNJ cobra resultado em mutirão de Pernambuco

CNJ cobra resultado em mutirão de Pernambuco


13/10/2011 - 00h00


O coordenador do mutirão carcerário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Pernambuco, juiz Éder Jorge, vai procurar o corregedor-geral da justiça do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) para cobrar empenho dos magistrados pernambucanos nos trabalhos. Iniciado em 16 de agosto, até  sexta-feira (07/10), o mutirão só cadastrou um terço dos processos de presos provisórios.

"O sistema tem aproximadamente 11 mil presos provisórios e os juízes cadastraram apenas 3.657 processos até o momento", afirmou o juiz Éder Jorge. Semana passada, o magistrado enviou ofício a todos os juízes com competência criminal no Estado com instruções para facilitar o cadastramento dos processos no sistema mutirão carcerário. "Infelizmente não houve resposta satisfatória até o momento", revelou.

Alguns contratempos e problemas estruturais ajudam a entender o entrave. A 3ª Vara de Execuções Penais (VEP) de Caruaru foi criada e instalada pouco antes do início do mutirão. Com isso, a competência sobre cerca de 2,5 mil processos de execução penal da 1ª e 2ª VEP foi transferida para a vara recém-criada no interior. Assim, enquanto os trabalhos do mutirão eram iniciados, os processos estavam sendo enviados de Recife a Caruaru, que fica a 130 quilômetros da capital.   

A lentidão das pesquisas no sistema do TJPE e a ausência de cálculo de penas e certidão carcerária em todos os processos também prejudicam o trabalho dos magistrados.

Na  segunda-feira (10/10), o juiz Éder Jorge  reuniu-se com o coordenador do mutirão indicado pelo TJPE para avaliar se será possível concluir a análise de todos os processos até a data prevista para o encerramento do mutirão, 20 de outubro. "Até o momento, cadastramos 6.376 dos processos de condenados, dentro de um universo de 9 mil, aproximadamente, a julgar pelo bom ritmo de trabalho que conseguimos estabelecer nas últimas duas semanas, acredito que seja possível", informou.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias

Um terço dos funcionáros da Polícia Federal se aposenta até 2016


Um terço dos funcionáros da Polícia Federal se aposenta até 2016

Cristiane Bonfanti

Publicação: 13/10/2011 07:46 Atualização:

 (Iano Andrade/CB/D.A Press)

A três anos da Copa do Mundo, não bastassem as filas nos aeroportos e a rede hoteleira saturada, a situação crítica vivida pela Polícia Federal ameaça a segurança do país que sediará o torneio de futebol e as Olimpíadas. Levantamento da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) revelou que 2.270 servidores da carreira — que inclui agentes, escrivães, delegados, peritos e papiloscopistas — poderão se aposentar até 2016. Isso sem contar os atuais 1.379 que já reúnem condições para parar de trabalhar, mas optaram por ganhar abono de permanência. Com isso, o total de funcionários que deixariam a corporação chegaria a 3.649, o que equivale a 32% do total em atividade.


Segundo o Ministério do Planejamento, há 6.185 agentes, 1.889 escrivães, 1.791 delegados, 1.110 peritos e 439 papiloscopistas na PF. Outros 2.646 estão no chamado Plano Especial de Cargos, que abrange os servidores administrativos. Nas contas de Cláudio Tusco, diretor da ADPF, somente entre os delegados, uma média de 25 pessoas por ano chegam à idade de se aposentar. Desde 2006, 235 cargos ficaram vagos. "Enquanto o número de delegacias cresce, o de profissionais diminui. Ao cortar recursos para a segurança, o governo causa impunidade e aumenta a corrupção. Poucas operações nossas estancam rombos de bilhões de reais nos cofres públicos do país", disse Tusco.


O levantamento da associação revelou também que o quadro de servidores da PF está ficando cada vez mais envelhecido. Hoje, 13,2% do atual efetivo têm mais de 51 anos de idade. No caso do Plano Especial de Cargos, esse índice chega a 37,3%. Tusco estimou que, para receber os próximos grandes eventos esportivos, a Polícia Federal necessitará de 4.174 novos profissionais. "Esse é um assunto que preocupa muito a gente. Nos últimos anos, o nosso efetivo não aumentou. A Argentina, um país muito menor que o nosso, tem 40 mil policiais federais. Aqui, a categoria está cada dia mais sobrecarregada. Não conseguimos investigar tudo o que é necessário", observou o diretor.


Procurada, a Polícia Federal se limitou a informar que aguarda do Ministério do Planejamento autorização para abrir concurso com 1.024 vagas, mas não quis dar detalhes sobre o quadro de pessoal da corporação. As oportunidades previstas são para os cargos de agente, escrivão, delegado e papiloscopista. No entanto, o corte nas seleções públicas e nas nomeações anunciado pelo governo para garantir o ajuste fiscal e proteger o país da crise global está emperrando a abertura do processo seletivo.


Jones Borges Leal, presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal (Sindipol-DF), disse que um exemplo da escassez de profissionais é o Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília. "São apenas quatro policiais para cuidar de todo o terminal. Além disso, as nossas fronteiras estão desguarnecidas. Há trechos de até 400 quilômetros que não têm sequer um agente de polícia. Hoje, 20 mil servidores na corporação ainda não atenderiam a demanda", avaliou.
Desde o início do ano, o Sindipol-DF organiza assembleias para discutir o caminho a ser tomado para pressionar o governo a conceder reajustes salariais. Embora a categoria não tenha conseguido dinheiro na proposta orçamentária de 2012 para garantir os aumentos, ela assinou com o secretário de Recursos Humanos, Duvanier Paiva Ferreira, um protocolo que define as diretrizes das negociações nos próximos meses. O documento diz respeito apenas aos cargos de agente, escrivão e papiloscopista, que recebem salário inicial de R$ 7.514,33 e final de R$ 11.879,08.


Eles discutem uma reestruturação para que, em três anos, a remuneração final chegue ao topo da carreira de oficial de inteligência, de R$ 18,4 mil, o que representa um aumento de 54,9%. No caso dos delegados e peritos, os vencimentos já vão de R$ 13,3 mil a R$ 19,6 mil. "A possibilidade de greve não está descartada. Estamos aguardando que o governo cumpra o que está estabelecido no protocolo e dê continuidade às negociações. O prazo vai até março de 2012", disse Leal.
A Polícia Federal é apenas um exemplo do problema vivido no governo como um todo. Estima-se que, até 2015, cerca de 40% do atual 1,1 milhão de servidores públicos federais em todo o Brasil estejam em condições de se aposentar. Ao menos 452 mil pessoas poderão deixar os órgãos públicos a qualquer momento. Hoje, 80 mil funcionários já recebem abono de permanência.


A tinta vermelha: discurso de Slavoj Žižek aos manifestantes do movimento Occupy Wall Street


A tinta vermelha: discurso de Slavoj Žižek aos manifestantes do movimento Occupy Wall Street

Slavoj Žižek visitou a Liberty Plaza, em Nova Iorque, para falar ao acampamento de manifestantes do movimento Occupy Wall Street (Ocupe Wall Street), que vem protestando contra a crise financeira e o poder econômico norte-americano desde o início de setembro deste ano.

O filósofo nos enviou a íntegra de seu discurso para publicarmos em nosso Blog, que segue abaixo em tradução de Rogério Bettoni.

***

Não se apaixonem por si mesmos, nem pelo momento agradável que estamos tendo aqui. Carnavais custam muito pouco – o verdadeiro teste de seu valor é o que permanece no dia seguinte, ou a maneira como nossa vida normal e cotidiana será modificada. Apaixone-se pelo trabalho duro e paciente – somos o início, não o fim. Nossa mensagem básica é: o tabu já foi rompido, não vivemos no melhor mundo possível, temos a permissão e a obrigação de pensar em alternativas. Há um longo caminho pela frente, e em pouco tempo teremos de enfrentar questões realmente difíceis – questões não sobre aquilo que não queremos, mas sobre aquilo que QUEREMOS. Qual organização social pode substituir o capitalismo vigente? De quais tipos de líderes nós precisamos? As alternativas do século XX obviamente não servem.

Então não culpe o povo e suas atitudes: o problema não é a corrupção ou a ganância, mas o sistema que nos incita a sermos corruptos. A solução não é o lema "Main Street, not Wall Street", mas sim mudar o sistema em que a Main Street não funciona sem o Wall Street. Tenham cuidado não só com os inimigos, mas também com falsos amigos que fingem nos apoiar e já fazem de tudo para diluir nosso protesto. Da mesma maneira que compramos café sem cafeína, cerveja sem álcool e sorvete sem gordura, eles tentarão transformar isto aqui em um protesto moral inofensivo. Mas a razão de estarmos reunidos é o fato de já termos tido o bastante de um mundo onde reciclar latas de Coca-Cola, dar alguns dólares para a caridade ou comprar um cappuccino da Starbucks que tem 1% da renda revertida para problemas do Terceiro Mundo é o suficiente para nos fazer sentir bem. Depois de terceirizar o trabalho, depois de terceirizar a tortura, depois que as agências matrimoniais começaram a terceirizar até nossos encontros, é que percebemos que, há muito tempo, também permitimos que nossos engajamentos políticos sejam terceirizados – mas agora nós os queremos de volta.

Dirão que somos "não americanos". Mas quando fundamentalistas conservadores nos disserem que os Estados Unidos são uma nação cristã, lembrem-se do que é o Cristianismo: o Espírito Santo, a comunidade livre e igualitária de fiéis unidos pelo amor. Nós, aqui, somos o Espírito Santo, enquanto em Wall Street eles são pagãos que adoram falsos ídolos.

Dirão que somos violentos, que nossa linguagem é violenta, referindo-se à ocupação e assim por diante. Sim, somos violentos, mas somente no mesmo sentido em que Mahatma Gandhi foi violento. Somos violentos porque queremos dar um basta no modo como as coisas andam – mas o que significa essa violência puramente simbólica quando comparada à violência necessária para sustentar o funcionamento constante do sistema capitalista global?

Seremos chamados de perdedores – mas os verdadeiros perdedores não estariam lá em Wall Street, os que se safaram com a ajuda de centenas de bilhões do nosso dinheiro? Vocês são chamados de socialistas, mas nos Estados Unidos já existe o socialismo para os ricos. Eles dirão que vocês não respeitam a propriedade privada, mas as especulações de Wall Street que levaram à queda de 2008 foram mais responsáveis pela extinção de propriedades privadas obtidas a duras penas do que se estivéssemos destruindo-as agora, dia e noite – pense nas centenas de casas hipotecadas…

Nós não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que merecidamente entrou em colapso em 1990 – e lembrem-se de que os comunistas que ainda detêm o poder atualmente governam o mais implacável dos capitalismos (na China). O sucesso do capitalismo chinês liderado pelo comunismo é um sinal abominável de que o casamento entre o capitalismo e a democracia está próximo do divórcio. Nós somos comunistas em um sentido apenas: nós nos importamos com os bens comuns – os da natureza, do conhecimento – que estão ameaçados pelo sistema.

Eles dirão que vocês estão sonhando, mas os verdadeiros sonhadores são os que pensam que as coisas podem continuar sendo o que são por um tempo indefinido, assim como ocorre com as mudanças cosméticas. Nós não estamos sonhando; nós acordamos de um sonho que está se transformando em pesadelo. Não estamos destruindo nada; somos apenas testemunhas de como o sistema está gradualmente destruindo a si próprio. Todos nós conhecemos a cena clássica dos desenhos animados: o gato chega à beira do precipício e continua caminhando, ignorando o fato de que não há chão sob suas patas; ele só começa a cair quando olha para baixo e vê o abismo. O que estamos fazendo é simplesmente levar os que estão no poder a olhar para baixo…

Então, a mudança é realmente possível? Hoje, o possível e o impossível são dispostos de maneira estranha. Nos domínios da liberdade pessoal e da tecnologia científica, o impossível está se tornando cada vez mais possível (ou pelo menos é o que nos dizem): "nada é impossível", podemos ter sexo em suas mais perversas variações; arquivos inteiros de músicas, filmes e seriados de TV estão disponíveis para download; a viagem espacial está à venda para quem tiver dinheiro; podemos melhorar nossas habilidades físicas e psíquicas por meio de intervenções no genoma, e até mesmo realizar o sonho tecnognóstico de atingir a imortalidade transformando nossa identidade em um programa de computador. Por outro lado, no domínio das relações econômicas e sociais, somos bombardeados o tempo todo por um discurso do "você não pode" se envolver em atos políticos coletivos (que necessariamente terminam no terror totalitário), ou aderir ao antigo Estado de bem-estar social (ele nos transforma em não competitivos e leva à crise econômica), ou se isolar do mercado global etc. Quando medidas de austeridade são impostas, dizem-nos repetidas vezes que se trata apenas do que tem de ser feito. Quem sabe não chegou a hora de inverter as coordenadas do que é possível e impossível? Quem sabe não podemos ter mais solidariedade e assistência médica, já que não somos imortais?

Em meados de abril de 2011, a mídia revelou que o governo chinês havia proibido a exibição, em cinemas e na TV, de filmes que falassem de viagens no tempo e histórias paralelas, argumentando que elas trazem frivolidade para questões históricas sérias – até mesmo a fuga fictícia para uma realidade alternativa é considerada perigosa demais. Nós, do mundo Ocidental liberal, não precisamos de uma proibição tão explícita: a ideologia exerce poder material suficiente para evitar que narrativas históricas alternativas sejam interpretadas com o mínimo de seriedade. Para nós é fácil imaginar o fim do mundo – vide os inúmeros filmes apocalípticos –, mas não o fim do capitalismo.

Em uma velha piada da antiga República Democrática Alemã, um trabalhador alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que todas as suas correspondências serão lidas pelos censores, ele diz para os amigos: "Vamos combinar um código: se vocês receberem uma carta minha escrita com tinta azul, ela é verdadeira; se a tinta for vermelha, é falsa". Depois de um mês, os amigos receberam a primeira carta, escrita em azul: "Tudo é uma maravilha por aqui: os estoques estão cheios, a comida é abundante, os apartamentos são amplos e aquecidos, os cinemas exibem filmes ocidentais, há mulheres lindas prontas para um romance – a única coisa que não temos é tinta vermelha." E essa situação, não é a mesma que vivemos até hoje? Temos toda a liberdade que desejamos – a única coisa que falta é a "tinta vermelha": nós nos "sentimos livres" porque somos desprovidos da linguagem para articular nossa falta de liberdade. O que a falta de tinta vermelha significa é que, hoje, todos os principais termos que usamos para designar o conflito atual – "guerra ao terror", "democracia e liberdade", "direitos humanos" etc. etc. – são termos FALSOS que mistificam nossa percepção da situação em vez de permitir que pensemos nela. Você, que está aqui presente, está dando a todos nós tinta vermelha.


quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Governo pretende erradicar fome até 2014, diz Maria do Rosário

Governo pretende erradicar fome até 2014, diz Maria do Rosário
11 de outubro de 2011 00h34 atualizado às 00h35

Daniel Mello

A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, disse na noite dessa segunda-feira que a erradicação da fome é uma meta que o governo pretende cumprir até 2014. Segundo ela, a luta para que não falte comida a nenhum brasileiro está incluída na agenda de combate à miséria.

"A meta nossa, do governo federal, é no final do mandato da presidente Dilma já termos um processo em que possamos dizer que nenhum brasileiro ou brasileira vive em miséria extrema, a fome é miséria extrema", declarou ao comentar a posição de liderança do Brasil no ranking da organização não governamental (ONG) ActionAid de países que mais combatem a fome.

O relatório da ONG destaca os resultados do Programa Fome Zero, com a diminuição da desnutrição infantil em 73% entre 2002 e 2008. Além de elogiar a inclusão do direito à alimentação na Constituição Federal em fevereiro de 2010.

A ministra disse ainda que merece comemoração o fato de o Brasil estar adotando uma política que busque tanto o desenvolvimento econômico como o bem-estar humano e social. "Nós estamos aqui para fazer com que o PIB Produto Interno Bruto real seja a qualidade de vida dos brasileiros e brasileiras e que o Brasil tenha uma boa integração com o mundo contemporâneo", declarou ao participar da abertura da 6ª Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul.

Para Maria do Rosário, o festival cinematográfico integra as ações da sociedade e do governo para promover uma cultura de direitos humanos no país. "Ela soma em toda uma movimentação que o Brasil faz, que governo brasileiro faz e que a sociedade faz".

Agência Brasil

‘Foco da Comissão da Verdade será a ditadura’, diz Aloysio Nunes

'Foco da Comissão da Verdade será a ditadura', diz Aloysio Nunes

Relator do projeto no Senado, tucano diz que pretende entregar relatório à CCJ na próxima quarta-feira, 19

11 de outubro de 2011 | 23h 04
Roldão Arruda / SÃO PAULO - O Estado de S.Paulo

Em entrevista ao Estado, o relator do projeto de lei da Comissão da Verdade, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), disse que ela só terá sucesso se focalizar as investigações no período da ditadura militar. Ele considera o projeto bom e acredita que não enfrentará problemas em sua tramitação no Senado.


O fato de ter sido perseguido e condenado no período do regime militar pode causar algum tipo de problema ou constrangimento para o senhor como relator?

Sou um senador da República, comprometido com a questão dos direitos humanos, e não um perseguido político. Fui condenado, anistiado, reintegrado à vida política e hoje estou aqui.

Quais suas impressões iniciais do projeto de lei?

Eu o conheço bem. Conversei com o ministro Nelson Jobim, antes de sua saída do Ministério da Defesa, quando ainda estava sendo elaborado, e acompanhei os debates na Câmara. Na minha avaliação é um bom projeto, que dá continuidade a uma série de mudanças institucionais que começam lá atrás, com o fim do AI-5, a Lei da Anistia, a criação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos no governo de Fernando Henrique Cardoso, as reparações, a criação de memoriais em vários Estados, a digitalização dos arquivos públicos do período da ditadura. Enfim, trata-se de mais uma etapa num processo iniciado há longo tempo e que precisa ser concluído.

Para familiares de mortos e desaparecidos, a comissão também deveria promover a reparação judicial, com a condenação dos responsáveis pelos crimes.

A comissão não tem caráter judicial, não vai funcionar como um tribunal de exceção. O objetivo é esclarecer as violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, com foco especial no período da ditadura. A apuração pode ter consequências na área do Judiciário, mas o objetivo da comissão não é este.

Outra crítica ao projeto é o período que abrange, considerado excessivamente longo.

Os autores do projeto decidiram adotar esse marco temporal, assim como poderiam ter adotado algum outro. É evidente, porém, que o foco da comissão deve ser o período da ditadura militar e as graves violações de direitos humanos praticadas naquele período. Deve ser uma abordagem ampla, que permita o esclarecimento de desaparecimentos forçados, a ocultação de cadáveres, a identificação das circunstâncias e das instituições relacionadas à pratica de violações de direitos humanos e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e do conjunto da sociedade. Se eu fosse membro da comissão, esse seria o meu foco.

Não acha o prazo de dois anos curto para essa tarefa?

A comissão não vai partir do zero. Já existe um acervo grande acumulado. Acho que o período de dois anos é suficiente, mas vale lembrar que o trabalho só termina quando a comissão concluir o seu relatório e que o prazo pode ser prorrogado por medida provisória. Seria importante, no entanto, que a comissão concluísse seu trabalho no governo da presidente Dilma.

Por quê?

Por causa do engajamento pessoal da presidente nessa questão. Pelas declarações que tenho ouvido dela, esse engajamento pode contribuir para o bom resultado e a eficácia do trabalho da comissão.

O que mais poderia contribuir para o bom resultado?

A qualidade dos membros que foram escolhidos para integrar a comissão, os meios que tiverem para trabalhar e sua capacidade para focalizar os pontos mais críticos.

Acha que o projeto pode enroscar no Senado?

Não acredito. Pelas conversas iniciais do ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, com as bancadas dos partidos, a tramitação será tranquila. Mas não posso garantir nada. Da minha parte vou trabalhar intensamente para entregar o meu relatório ao presidente da CCJ na próxima quarta-feira. Não sou de segurar projeto.

Justiça paulista decide se envolver no combate ao crack

Atuação direta

Justiça paulista decide se envolver no combate ao crack

Por Camila Ribeiro de Mendonça

O Judiciário paulista vai se envolver diretamente no combate ao crack. Trata-se de uma iniciativa inédita e pioneira, desenvolvida pelo desembargador Antonio Carlos Malheiros, coordenador da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo. Um posto de atendimento para definir a internação compulsória de crianças e adolescentes viciados será colocado na região conhecida como Cracolândia.

"A proposta é conhecer a situação da criança. Ela será beneficiada porque vamos procurar os dois lados dessa questão, do menor e da família. Com isso, teremos condições de decidir se encaminhamos a criança para um abrigo, para uma clínica, ou até se tem condições de voltar para casa", afirma o desembargador idealizador desse projeto.

Uma equipe móvel vai circular pelas ruas para entrevistar os jovens e avaliar o que pode ser feito para ajudá-los. "Vamos ouvir as crianças e os adolescentes para saber quem são, de onde vêm, onde estão as suas famílias", explicou o desembargador.

Com as informações das entrevistas, os integrantes do Judiciário poderão tomar, com mais rapidez, medidas para auxiliar os menores em suas necessidades. "Vamos exigir vagas [nos centros de recuperação de dependentes químicos], exigir qualidade na prestação dos serviços e evitar, mesmo que não haja resistência das crianças e adolescentes, a internação. O tratamento em meio aberto é nossa pretensão", destacou.

Para o defensor público Carlos Weis, que está envolvido com o projeto e falando diariamente com o desembargador, a posição da Defensoria é clara: eles estão totalmente envolvidos numa perspectiva de levar o Estado de direito para Cracolândia, uma vez reconhecido que os serviços municipais são insuficientes.

Segundo Weis, a ideia do projeto é justamente fiscalizar se os direitos das crianças e aos adolescentes, garantidos pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), estão sendo devidamente cumpridos. Para isso, estarão presentes na Cracolândia juízes, defensores e promotores.

"Geralmente essas crianças têm problemas familiares, o craque surgiu para elas como um substituto dos vínculos sociais. O poder público deve abrigá-las, fornecer atividades, aconselhamento psicológico, não se trata de favor da prefeitura e sim um direito", afirma Weis.

Ele ainda enfatizou que a Defensoria Pública de São Paulo é totalmente contra a internação compulsória, o que, segundo ele, contraria o artigo 4 da Lei 10.216 (a internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes). "Jovens não se podem ser tratados como coisas e levados por uma carrocinha até o canil", defendeu.

Segundo o defensor, será feito um mapeamento dos pais, a fim de checar se assistente social foi até a casa da família, se os familiares estão cumprindo com suas obrigações. Os juízes eventualmente vão garantir se as crianças têm acesso aos serviços como abrigo, caso contrário, determinarão ordem judicial para obrigar a prefeitura providenciá-los.

Camila Ribeiro de Mendonça é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 8 de outubro de 2011